James, Frango

Nunca tinha prestado muita atenção em James Franco até ver Milk. Já tinha visto os dois primeiros Homem Aranha (nunca vi o último) e ele nunca tinha me despertado nada, a não ser uma certa raivinha pela canastrice dele. Aí, em Milk, ele aparece sem canastrice alguma, com aquele aspecto sujinho dos anos 70, sujinho na medida certa – o conceito de sujinho higiênico eu acho meio difícil de explicar, mas acho que todos entendem. E fofo, paquerando romanticamente no metrô com Sean Penn, um negócio meio amor à primeira vista em lugar inusitado que sempre me encanta (até hoje não perdoo uma amiga minha que não levou em frente um romance com um cara que ela conheceu ilhada numa padaria por causa da chuva).

Aí pronto, fiquei obcecado por James Franco. E toda obsessão que se preze leva a pessoa a stalkear. Como não tinha acesso às redes sociais dele, fui parar no imdb, do imdb pra Wikipédia, da Wikipédia pras pesquisas avançadas do Google. Descobri que James estava estudando cinema. Descobri que, antes de estudar cinema, ele já tinha dirigido dois longas, um deles com essa capa:

Quase parei aí. Mas, quando a gente se apaixona, até os defeitos do outro viram motivos pra você se apaixonar mais ainda. Além do mais, o filme podia até ser bom, tem tanto filme maravilhoso por aí com capa tosca, não tem? E agora ele estava estudando cinema, ia melhorar mais ainda. (Mas não tive coragem de ver esse filme, nem o filme sobre James Dean que ele fez pra TV, acho telefilme biográfico uma das coisas mais deprimentes).

Prosseguindo com as minhas pesquisas, vi que os três curtas que ele tinha dirigido na faculdade eram inspirados em poemas de poetas homossexuais. Um deles tinha temática gay (temáticagay, pior cacófato da história, já disse isso 10 vezes): The Feast of Stephen, de Anthony Hecht. Começa falando de um vestiário com homens nus se olhando, depois tem um trocadilho que eu achei horroroso, “mens sana in men’s sauna”, depois fala de um ataque homofóbico com um homossexual sendo espancado e estuprado por vários homens. Outro dos poemas que ele filmou, Herbert White, de Frank Bidart, era ainda mais punk: um assassino pedófilo narrando os seus crimes. Pra quem tinha feito um filme sobre a amizade de um jovem e um macaco, era realmente uma mudança e tanto – embora depois eu tenha ficado pensando que tipo de amizade era essa… Além do mais, The Ape foi lançado por uma distribuidora que praticamente só trabalha com filmes gay themed, a TLA.  Não achei nenhum dos filmes “poéticos” pra ver. Nem mesmo um trailer, nada, nada.

Mesmo sem ver os filmes, aparentemente James estava se tornando um artista corajoso. E interessado demais nos gays. É engraçada essa coisa que muitos gays têm quando descobrem que um famoso interessante é gay também, fica uma ilusão de que aquela pessoa agora está acessível sexualmente, que um dia pode rolar, coisa e tal. Ou seja, igual à relação entre a espectadora e o galã da novela. De qualquer forma, realmente James parecia estar fazendo o seu outing artisticamente. Depois desses três curtas, ele prosseguiu na exploração do tema homossexual. Interpretou outros poetas gays: Ginsberg em Howl, Hart Crane em The Broken Tower (que também roteirizou e dirigiu). Dirigiu o curta Masculinity & Me, exibido no Festival GLBT de Torino, e o longa Sal, sobre o ator Sal Mineo, de Juventude Transviada, que assumiu a homossexualidade no final dos anos 60. E co-dirigiu, junto com Travis Matthews (diretor do curta e depois longa I Want Your Love, “com cenas de sexo explícito gay”), Interior. Leather Bar., que deveria ser uma reimaginação das cenas de cruising bar que foram cortadas de Parceiros da Noite (filme sensacional, baixem correndo), mas que acabou virando um making off de como seria uma reimaginação das cenas de cruising bar que foram cortadas de Parceiros da Noite. A Variety acabou com o filme, dizendo que era “a prova de que um filme filmado em um dia e meio pode passar em Sundance se tiver James Franco no meio” e que estava “destinado à obscuridade depois do festival”.

James, por sinal, nunca assumiu nada publicamente. Disse que o interesse nesses personagens é por causa dos obstáculos que as pessoas com um estilo de vida anti-normativo encontram. Aí completou, fazendo piada: “ou talvez eu seja gay”.

marilyn james

Infelizmente, sempre tem um dia em que você se desapaixona. É claro que há todo um processo de desapaixonamento, a relação vai se desgastando aos poucos. Mas sempre tem um dia em que você percebe: eita, não tô mais apaixonado. Na minha relação com James, esse dia foi o dia do Oscar. Primeiro, não entendi por que ele aceitou apresentar a cerimônia, não parecia ser a dele esse tipo de coisa. Depois achei que seria muito bom, que ele ia conseguir fazer aquilo com ironia, que ia ser engraçado. O problema foi justamente esse: não foi engraçado. Havia algo de esnobe em tudo o que ele fazia, naquela cara de “tô nem aí pra essa pataquada”, ele filmando tudo com o iPhone, mas nada tinha graça. Se era pra mostrar o quanto aquela festa toda era ridícula, que ele enfrentasse aquilo de verdade, desse uma escrachada geral. Mas não, ele seguia o roteiro rigorosamente – inclusive se travestir de Marilyn sem nenhum motivo aparente – só que com enfado. Um ar de “eu sou melhor que você”.

Daí pra frente foi ladeira abaixo. Peguei raiva de James. Passei a achar que ele era burro. O pior tipo de burro, aliás: aquele que se acha bem mais inteligente do que é. Esses me dão muita raiva, dá vontade de sentar e dizer “meu amor, entenda, você NÃO É genial, é só um truque”. E é claro que existe, sim, a possibilidade de ele ser de fato genial e o burro que se acha inteligente ser eu, mas quando a gente se desapaixona, tudo o que era lindo vira defeito instantaneamente.

E aí começaram as notícias de que James resolveu fazer tudoaomesmotempoagora, sempre com um quê de cool. Além de estudar cinema, ele também fazia concomitantemente um mestrado em Escrita Criativa e um doutorado em Inglês. E filmes, muito filmes. Justamente quando eu estava empenhado no processo de esquecê-lo (processo esse que dura até hoje), toda semana tinha uma notícia nova sobre James Franco (e tem até hoje). Resolvi fazer um pequeno apanhado (com certeza incompleto) sobre as atividades de James nos últimos três anos:

– Atuou em 22 longas-metragens
– Atuou em 3 curtas
– Atuou em 54 capítulos da novela General Hospital
– Atuou em 6 episódios da série da Nickelodeon Hollywood Heights
– Protagonizou uma videoarte em que quebra um quarto cenográfico durante quarenta minutos
– Faz performances com a artista Laurel Nakadate
– Dirigiu 7 longas-metragens
– Dirigiu 5 curtas
– Dirigiu dois videoclipes pro R.E.M.
– Reeditou My Own Private Idaho (que virou My Own Private River) pra mostrar numa galeria de arte
– Fez todas essas graduações, mestrados e doutorados que falei lá em cima
– Fez uma exposição individual como artista plástico, chamada Dangerous Book Four Boys, com videos, desenhos, esculturas e instalações. A exposição esteve em várias galerias dos EUA e da Europa.
– Lançou um livro sobre essa exposição
– Lançou outro livro, só que de contos, Palo Alto (que não é ruim, mas também não é bom)
– Ministrou um curso de edição (chamado Editando James Franco – com James Franco)
– Apresentou o Oscar com cara de bunda
– Mostrou a bunda propriamente dita nessa revista:

O que mais me incomoda nele é que tudo isso que ele faz me parece uma grande egotrip. Ele se acha. Embora exista quase sempre um tom de autoparódia, há também um quê enorme de autopromoção. Em vários desses milhões de filmes ele interpreta ele mesmo. Erased James Franco mostra ele reencenando vários papeis que ele já interpretou, com um bônus: ele ainda faz o papel de Julianne Moore em Safe. Em Maladies, ele interpreta um ator chamado… James, que se aposenta precocemente no auge da carreira (Catharine Keener interpreta Catharine e o diretor Carter – o mesmo de Erased James Franco – interpreta, hm, Carter). Até chegar ao cúmulo de co-dirigir e estrelar um filme chamado FRANCOPHRENIA.

Não dá, James, não dá pra querer fazer tudo, a pessoa tem que ter foco. É o que vivem dizendo pra mim. E aí me dou conta de que talvez – talvez – o meu ódio por James Franco seja justamente porque ele tem mil projetos e realiza todos eles. Eu tenho mil projetos e fico aqui, escrevendo sobre James Franco. Mundo injusto da porra.

Toda essa parte eu escrevi em agosto do ano passado. Não publiquei por motivos de: não sei.

Mas o tempo passa, o mundo gira, o mundo é uma bola e, aparentemente, não sou só eu quem pensa isso. Lena Dunham, apesar de estar me decepcionando bastante nessas últimas semanas, me vingou um pouquinho.

Uma das mil coisas que James Franco fez no ano passado e que eu não citei ainda foi escrever uma crítica de Girls pro Huffington Post. Entre outras coisas, ele falava que a série tinha a obrigação de mostrar negros, já que a HBO a vendia como se fosse “uma representação da Nova York jovem”. E que não conseguia se identificar com ela porque só tinha loser.

Aí, essa semana, Leninha respondeu:

“Eu acho que alguém falou pra James Franco que ele tem obrigação de dar opinião sobre tudo que acontece na cultura. A gente ainda vai descobrir que ele tá na CIA, que ele é bombeiro, e que vai pra próxima missão tripulada pra Lua junto com Lance Bass”.

Beijos.

Deixe um comentário